O dia em que vi uma pessoa jogando um jogo que fiz na Electronic Arts
Hoje aconteceu algo que até então eu não tinha presenciado: vi uma pessoa no metro jogando um jogo que programei quando trabalhei na Electronic Arts, o FIFA 12 para Android. Isso foi tão diferente que tive vontade de compartilhar aqui esta experiência.
Jogos são uma forma interativa de entretenimento, que proporciona para muitas pessoas diversão e um momento de tranquilidade (ou não), uma fuga da realidade do dia-a-dia. Como Huizinga escreveu em seu livro Homo Ludens, o ser humano sempre inventou maneiras de transformar coisas em jogos, e todos gostam e precisam de jogos para se divertir, aprender e desenvolver o raciocínio lógico.
Enquanto um jogador pensa que encaixar blocos do Tetris é apenas um passa-tempo, por trás disso ele está desenvolvendo seu raciocínio lógico. Quantos casos já não vimos do uso de jogos para aprendizado, e até mesmo em fisioterapia. Quantas vezes já não ouvimos falar de pessoas que se conheceram, ficaram amigos, namorados e até casaram por causa de um jogo? Quantos grupos de amigos não se juntam para jogar? Quantos produtos e indústrias nasceram por causa dos jogos?
É incrível como um jogo pode fazer parte e até mudar a vida de uma pessoa, e é mais incrível ainda ter o “poder” de causar este efeito. Quando fazemos um jogo e algum amigo joga, mesmo que ele diga que está muito bom, não é a mesma coisa que você ver uma pessoa que nem sabe quem é jogando o seu jogo por escolha própria. É um sentimento engraçado imaginar que as horas de trabalho, todo estresse e preocupações, no final, valeu a pena por que você alcançou seu objetivo: estão se divertindo com seu jogo.
Eu já tinha visto pessoas jogando FIFA 12 no iPhone, mas a versão de Android que eu trabalhei saiu um tempo depois. Esta foi a primeira vez que eu vi alguém jogando, e senti uma vontade enorme de ir falar com esse cara, perguntar o que ele achou do jogo e falar que eu participei do desenvolvimento, e que inclusive meu nome está nos créditos. Fui pego tão de surpresa que fiquei sem reação, apenas observando. Acho que em uma próxima oportunidade eu talvez vá conversar.
Hoje temos tantas formas de se distrair no metro, tantos jogos para jogar e livros para ler. Quando alguem escolhe o seu jogo para passar esse tempo até o trabalho ou faculdade, é um sentimento de honra e dever cumprido que só mesmo uma área ligada ao entretenimento pode causar.
Isso me deixou com saudades também. Tive uma experiência que pouquíssimas pessoas puderam ter, de trabalhar em uma empresa tradicional de games no Brasil, e ainda desenvolver jogos novos. Muita gente acha que empresas vem para o país fazer porting e localização, mas muitas desenvolveram jogos por aqui, como a Electronic Arts, Ubisoft, Glu Mobile e Gameloft.
O FIFA 12 foi um projeto incrível, com partes de código de versões muito antigas e muita história para contar. Um projeto que levava 1 hora e 30 minutos para compilar (a partir de um clean) e que tinha 40GB de arquivos, um jogo AAA para dispositivos móveis. Ainda vou falar mais sobre este e outros projetos que trabalhei na EA e na Glu quando for postar sobre meu portfolio profissional. No final do FIFA 12 eu era o líder de uma equipe pequena, mas que juntos conseguimos entregar um jogo de qualidade para o Android.
Quando a EA fechou as portas por aqui, me senti como se o Zangief tivesse dado um soco no meu estômago, esperado eu melhorar, e então feito isso de novo por horas. Em 3 anos deixei de ser apenas um estudando de jogos, passei pela Glu Mobile, e me tornei Lead Programmer na Electronic Arts. Participei de projetos incríveis como Tetris, FIFA 12 e Scrabble, todos para Android e com meu nome nos créditos. Sinto um vazio, como se tivesse voltado alguns degraus para trás na minha carreira em jogos, mas sei que logo voltarei a criar jogos tão incríveis quando os que fiz na EA.
Como ouvi uma vez, só existe uma coisa que te impede de fazer qualquer coisa: você mesmo.